A polêmica em torno da saia masculina volta à tona de tempos em tempos. Roupas representam gênero?

A resposta a essa pergunta é mais complexa do que imaginamos e depende de diferentes eras, da necessidade trivial do ser humano em cobrir o corpo, do acesso ao tear e técnicas de costura, e… bem, depois de tudo isso, das chamadas convenções sociais.

A História da Humanidade mostra que a indumentária das primeiras civilizações era baseada em túnicas e saias para ambos os sexos. Já há milênios, os egípcios antigos utilizavam o linho para um tipo de saia presa na cintura para os homens e vestidos amarrados nos ombros para mulheres. Os gregos vestiam mantôs torcidos feitos de lã e algodão em vários comprimentos para toda a família.

A civilização romana, sem distinção de gênero, usava uma espécie de camisa até os joelhos – por baixo de estolas e togas volumosas. Nestes três berços civilizatórios que são a origem da cultura ocidental, os marcadores do visual masculino ou feminino sempre foram os acessórios, como cintos, alfinetes, brincos, colares, perucas, tiaras e outros enfeites para a cabeça.

Foi apenas na época medieval que a roupa bifurcada, ou seja, a calça masculina se tornaria uma peça de roupa corriqueira. A partir deste período se deu enorme importância às diferenças no vestir deles e delas, culminando na proibição de mulheres usarem calças na França, por lei instaurada no ano de 1800. Isso ocorreu pouco depois da Revolução Francesa de 1789, que marcou o início da Idade Contemporânea.

Nada que intimidasse a estilista responsável por revolucionar o vestuário feminino Gabrielle “Coco” Chanel, que no início do século XX vestiu as calças do namorado para ir à praia e detonou uma tendência sem volta, lançando logo depois pantalonas não só para as suas clientes parisienses, mas também para a indústria do cinema em Hollywood – e assim, consequentemente, para o mundo todo.

Aqui no Brasil também tivemos um artista-ícone em prol do movimento pela liberdade na moda – no caso, para homens. O pintor, cenógrafo, escultor e escritor Flávio de Carvalho criou um protótipo de roupa para trabalho nos trópicos em 1956, desfilando ele mesmo o polêmico traje pelo centro da cidade de São Paulo. Chamado de New Look (em uma clara ironia ao New Look feminino de Christian Dior do ano de 1947), consistia em duas peças leves: uma saia e uma blusa soltas, que tinham o intuito de readequar o padrão europeu do terno quente e fechado que claramente não condiz com o calor dos países abaixo da linha do Equador.

A reflexão que fica é: se o sexo feminino precisou apenas se recolocar com firmeza e segurança para garantir a possibilidade de usar uma peça considerada masculina por tanto tempo, tornando as calças lugar-comum em nosso guarda-roupa há mais de um século, por que a sociedade atual debate tanto o uso de saias pelos homens? Afinal, a história já provou que a vestimenta não é fator determinante para a masculinidade. Que tal retomarmos o New Look para os homens?

*Matéria originalmente publicada no www.portalpepper.com.br
*Foto capa (crédito: reprodução instagram João Pimenta)